quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Um convite a uma reflexão

Façamos uma breve e muito simplória reflexão sobre o motivo que me leva os dedos ao teclado (não, não tento me promover como um Machado moderno, LOL), imaginemos a seguinte situação: você é um negro judeu recém-chegado na Polônia, ao ano de 1937. Você e sua esposa (grávida de 3 meses), também judia, vivem bem, apesar do anti-semitismo que os rodeia e da dificuldade com a comunicação.

Alguns anos se passam. Sem aviso, tropas alemãs invadem sua cidade e o medo a tua alma. Tem início uma tenebrosa caça nonsense. Invadem sua casa, prendem você e sua esposa e os colocam em um trem, abarrotado de gente, sem água ou comida, para uma viagem de uns 2 dias. Muitos morreram nessa viagem horrenda, porém o pior está por vir. Ao desembarcar, você se depara com uma enorme área cheia de pessoas desconhecidas esperando para adentrar naquele lugar. Separam-no de sua esposa e te mandam para um quarto pequeno, sujo, profundamente desconfortável com espaço quase nenhum.

A ti, nada chega sobre sua esposa e de seu futuro filho (ou será filha ?), mas sois obrigado a trabalhar duro, por horas a fio, carregando ferro de um lado para o outro. Seus braços não mais te obedecem, mas você de alguma forma sabe que não pode parar de fazer aquilo. A angústia cresce em seu peito a cada quarto de hora que passa, sem saber o que acontecerá no minuto seguinte, ou o que aquelas pessoas estranhas vestidas de cinza e que nunca falam manso farão a você - ou o que já fizeram a sua esposa. A comida é insuficiente e ruim, sua cama não tem colchão e você dorme com insetos e pessoas amontoadas. Faz muito frio, mas não te dão o necessário para que você se sinta minimamente bem - se é que isso é possível.

Te mudam de serviço e agora seu serviço é incinerar cadáveres. Você não se choca muito, pois agora sabe que ali se mata como se respira e, por isso, resolve trabalhar. Passaram-se 10 meses dessa existência angustiante, você não vê sua esposa há meses e não sabe mais nada sobre o que aconteceu a ela ou a seu filho (ou será filha ?). Em meados do gélido inverno, você recebe no carrinho os corpos de sua mulher e daquele que você deduziu ser o seu recém-nascido filho (era um menino), que você só conhecera pálido e frio. Seu coração dispara, seu mundo dispenca. A dor que te aflige é tanta que parece ninguém no mundo haver passado por isso antes. E você nunca sequer entendeu a causa de tanta desgraça. O que fizera você a eles ? Por que fazem isso contigo ?? Mas, no meio de tanta dor, ninguém parece se importar e só o que fazem é gritar contigo para que acelere o trabalho - eis o fluxo normal das coisas. Você queima sua mulher e seu filho, esvaziado de sentidos.

Mas a quem você reclamaria ? Naquele lugar, só quem sofre pensa no sofrimento e deseja que cesse. Ninguém está lá por você. Você não fala aquela lingua, e sabe de uma forma ou de outra que, se você fosse loiro com olhos azuis, aquilo provavelmente não estaria acontecendo. Mas seria isso motivo para fazerem tais coisas com você e tantos outros? O fato de você ser um negro judeu é relevante para que te exponham a tamanha dor ?

Não há ninguém que pense em você. Ninguém fala por você, nem pensa no seu bem estar. Você é visto como um ser inferior e não merecedor da tranquilidade e do direito à vida. Mas até que um dia, te mandam tirar a roupa e deixar ali seus pertences. Um deficiente físico que ali está diz para você que os estão mandando tomar banho e te pede ajuda... Você concorda. Também dezenas de outros homens entram com você em um compartimento grande e claro. Ao adentrarem, já nús, em tal cômodo, são trancados e uma fumaça é exalada de todos os cantos. Pavor geral. Você sabe que irá morrer, mas não há nada que possa fazer. Você está indefeso, fraco e em pânico. Muitas dúvidas latentes e insolúveis latejam na sua cabeça, que começa a rodar e enturvecer. Enfim, após meses de medo, extremas dores e intensa inconformidade, você morre.


A comparação com o nazismo é óbvia, pois como disse Isaac Singer (ganhador do Nobel de Literatura), "para os animais, os homens são todos nazistas.". O que fiz nada mais foi do que deslocar pontos de vista. Mudar, de certa forma, o centro psicológico da singela narrativa

Ninguém pensa no animal ou no que ele deseja - sim, deseja. É imposto a ele um destino cruel e profundamente sofrido, ao qual não há escapatória. Seu fim também é dado no dia e da forma que bem entendem seus assassinos, sem que haja chance de defesa.

"Afffff, o cara comparou um judeu a animal. Ele que é nazista !!" dirá o irrefletido leitor. Mas eu replico, pois a minha vida é tão vida como a vida de um rato. Eu vivo, o ratinho vive, a ovelha vive, você vive. Sim, neste sentido estou(amos) em pé de igualdade com um ratinho. Apesar de tantas diferenças, há semelhanças: assim como eu, ele quer viver sem dor. Assim como eu, ele sente fome, sede, frio, medo, alegria, afeição e pânico. Somos o centro psicológico de nossas próprias vidas. Ele (o rato) não se meteria em um laboratório para ser aberto a torto e a direito, eu também não. Eu posso não ser igual a ele, fisicamente ou em alguns aspectos psicológicos, mas isso não me dá direito de impor a ele o que EU bem entendo. Além do mais, duvido que aquele que me lê agora é igual a mim - nós, brasileiros, somos vira-latas também. Somos uma grande mistura de vidas, de classes, gêneros, costumes e cores de pele. Todos somos diferentes, logo únicos no mundo.

Neste sentido, em nada é um absurdo comparar-me a um rato. E por que seria absurdo comparar um judeu a um rato ?? Seria preconceito pensar isso, pois colocar o judeu como diferente de mim ou do rato, sendo que há inegáveis semelhanças e é nelas que me foco para fazer tais comparações. Só para explanar um pouco a mensagem que quero passar, uma curiosidade: os porcos - após uma existência regada de dor, canibalismo, desespero e tortura - ao formarem a fila que precede o abate (paredes estreitas a ponto do animal não conseguir olhar para trás e altas, muito altas), são acometidos por, pasmem, ataque de pânico. Com os mesmos sinais observáveis no animal humano: taquicardia, suor, medo, agitação...


Pense no mais fraco e no oprimido, um dia ele pode ser você.

Um comentário:

  1. Adorei a sua comparação com o rato!!!!!, faz todo sentido
    Espero que em breve todas as pessoas tenham consciência de que os animais são uma VIDA, e que tem o direito de viver, sentem fome, sede, frio, medo, dor, são seres vivos e que merecem ser bem tratados e tem o direito a vida.

    Beijos

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