quinta-feira, 8 de julho de 2010

Pensar no outro

Se há uma premissa básica do pensar vegetariano esta é o outro. Alguns chamam de o próximo e adoram dizer que devemos fazer o bem ao nosso próximo. Mas, quem é o próximo? Por que devemos fazer bem a ele ? Talvez seja pelo fato de que nós também sejamos o "próximo" de alguém e, naturalmente, gostariamos de que fizessem o bem a nós sem que nos fosse cobrado algo por isso. Assim sendo, nasceu o dito popular "fazer o bem sem olhar a quem". No entanto, não parece que as pessoas entendem essa máxima por completo. Me lembro de durante as enchentes em São Paulo ter visto, na TV, uma cena muito triste - além do óbvio. Um homem, em um telhado ou um bote, não lembro ao certo, cercado por água. De repente, um cão aparece nadando, notadamente exausto - dado o esforço que fez - e tenta ir para o abrigo, junto ao homem. Mas, mesmo em meio ao caos e às dificuldades do momento, o ser [des]humano mostra sua faceta podre: o homem repeliu o animal, impedindo-o de alcançar a superfície segura. O que foi deste animal, não se sabe. Do homem tampouco. Fato é que não há momento para se ser bom ou ruim. Mas, será que se fosse uma criança em apuros o homem faria o mesmo que fez com o animal ? Bem, suponho eu que não. Não que ele tenha dado provas de quão amoroso e benfeitor ele seja, mas é uma criança humana. A diferença entre a criança e o cão é só uma: a espécie. Mas mais do que suficiente para que, ao visto daquele homem e de muitos outros, um mereça viver e outro não; um mereça calorosa acolhida e o outro desprezo.

Temos visto o lançamento de muitos filmes que demonstram que, ante um fim maior, apocalíptico, padecemos juntos, homens e animais, lado a lado – e todos lutam pela sobrevivência. Nessa hora, tudo se mistura, não há mais distinções. São negros, loiras, cervos, peixes, crianças, felinos, garotos, adultos, bovinos, índios, brancos e pássaros tentando sobreviver, todos temerosos pela própria vida. Neste momento, todos formam uma única massa. Infelizmente, há de se vislumbrar catástrofes globais para que se exprima tal relação que, na verdade, existe desde que se fez a vida na Terra. Neste sentido, o mega-sucesso de bilheterias “Avatar” demonstra, com ares de brilhantismo, a “conexão” que os produtores do documentário “Earthlings - Terráqueos” tanto pedem para que façamos: somos vários, mas somos um só – somos irmãos, mais do que de sangue ou afinidade: vivemos e dividimos um espaço que, visto do espaço, não tem barreiras políticas, não conhece fronteiras nem limites. Por que a vida teria? Não tem. Ela está presente nas plantas, nos animais e nos animais-humanos, não a toa temos uma única palavra que expressa tal conceito de existência: vida. O pato e o homem vivem. Portanto, a criança merece a vida na mesma medida que o cão, pois ocupam um espaço no universo cujo propósito de ser está tão longe de nossa compreensão quanto Alfa Centauri está do sol.

Enquanto Mattia, do romance de Pirandello, amaldiçoa Copérnico por revelar ao homem sua pequenez ante o universo, eu o agradeço: sei que não sou o centro de todas as coisas, sou pequeno, uma poeira de átomo do universo. Somos todos assim, sotopostos ao mesmo céu e merecedores do sopro uno de vida que invade a todos que AQUI moramos e que aqui vivemos.

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